Feminista



PELA CONSTRUÇÃO DE UM MOVIMENTO DE ENFRENTAMENTO A VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER BRASILEIRA E SUA VALORIZAÇÃO NO ESPAÇO PÚBLICO.*
Mulheres da TLS no III Congresso Nacional da corrente, SP, 2015 
1. O Movimento de Mulheres e a luta por igualdade, representatividade e construção de uma sociedade que rompa a cultura patriarcal predominante na estrutura neoliberal.

O ano de 2013 foi um ano marcante na retomada dos movimentos sociais, o povo saiu as ruas, demonstrou sua insatisfação com a política neoliberal vigente e as mulheres foram protagonistas desta ação. Muitas jovens e mulheres adultas, idosas fizeram parte desta caminhada. As grandes manifestações que sacudiram o Brasil demonstraram os sinais de esgarçamento do modelo econômico e político da burguesia que domina este país na figura de implementação do Estado Mínimo e esvaziamento das poucas políticas públicas existentes. No campo das bandeiras feministas as políticas não passam de mero retoque superficial: faltam Casas Abrigos para mulheres vítimas da violência, delegacias 24h destinadas ao atendimento que respeite a especificidade dos dramas vividos pelas mulheres, falta também, uma política de mulheres nos partidos políticos. Estes se preocupam com a cobertura necessária as cotas, contudo, quantos quadros femininos temos a frente da direção do país, da política, dos movimentos sociais, do parlamento seja no plano federal, estadual e municipal. Na condição de dirigir as políticas, ainda somos poucas.  As bandeiras de luta levantadas foram diversas e expressou um descontentamento mais geral do povo contra as péssimas condições de vidaque se aprofundam e se avolumam nos centros urbanos brasileiros.

Observamos nestes movimentos uma grande participação das mulheres estudantes, trabalhadoras, negras, lésbicas etc. reivindicando e atuando na busca por direitos e ampliação dos mesmos não só para mulheres, mas para toda a sociedade brasileira. Os diversos movimentos feministas do Brasil se mostram sintonizados com as bandeiras de luta geral do país. A mulher se insere na luta contra a exclusão da maioria da população que vive sem acesso a serviços públicos de qualidade na saúde, educação, segurança pública, habitação, cultura, lazer e, sobretudo, no mundo do trabalho, pois se inserir nele não significou garantir uma inserção de qualidade.

No que tange aos debates específicos das lutas feministas, nos últimos anos vem acontecendo no mundo e no Brasil Conferencias de políticas para as mulheres no sentido de acelerar os progressos para alcançar a igualdade entre homens e mulheres respeitando suas diferenças, se sobrepondo a desigualdade estruturada na divisão sexual do trabalho. Somente assim alcançaremos a mentalidade autônoma das mulheres, isso se realiza na medida em que sua consciência feminista se expande e se amplia na sociedade patriarcal.

É nesta sociedade onde as mulheres lutam e se contrapõe a discriminação milenar contra elas. As Conferências envolvendo os quadros do movimento feminista são muito importantes, contudo somente a formação de núcleos culturais de mulheres que dialoguem sobre os temas de corpo (em sua especificidade biológica), movimento, trabalho, vida domésticas, prazer, violência, dupla e tripla jornada de trabalho poderão sedimentar um novo lugar para as mulheres na vida política e social. Somente assim avançaremos na formação de mais quadros de mulheres tão necessários a essa sociedade patriarcal, sem uma cultura matriarcal dificilmente o patriarcado se altera no que se refere a mudança de mentalidade, linguagem e prática cultural.

No campo macro a ONU-Mulher possibilita a constituição de políticas e semeia ideias para que os governos realizem. Neste sentido, é um importante espaço. Nota-se que, “no primeiro ano da ONU, o Conselho Econômico e Social (ECOSOC) estabeleceu sua Comissão sobre o Status da Mulher, como o principal órgão de decisão política dedicado exclusivamente à igualdade de gêneros e ao avanço das mulheres. Uma de suas primeiras realizações foi assegurar a neutralidade de gênero no projeto de Declaração Universal dos Direitos Humanos”. Chama nossa atenção o termo neutralidade de gênero, para nós, mulheres combativas do PSOL ela inexiste, visto que  concebemos gênero como uma ferramenta que ajuda-nos a enxergar as diferenças entre masculino e feminino no cotidiano da sociedade patriarcal, sabendo que o masculino infelizmente ainda é hegemônico. Entendemos que para as mulheres não há outro caminho senão o de lutar por políticas públicas de gênero no campo macrossocial e o de disputar mentalidade matriarcal nas relações interpessoais do cotidiano da sociedade patriarcal, instrumento exemplar na permanência da sociedade de classe.

No Brasil, o movimento de mulheres teve papel decisivo em todos esses momentos, seja organizando seminários, debates e encontros preparatórios aos fóruns não governamentais destas conferências, como – e principalmente – pressionando e contribuindo para a formulação da posição do governo brasileiro nesses encontros internacionais.

Porém ainda falta muito! A situação da mulher trabalhadora no Brasil, por exemplo, seja da cidade ou do campo, tem sido dificílima. Mesmo tendo uma presidenta mulher pouco avançamos na pauta de reivindicações feministas. Apesar de se ter a Lei Maria da Penha, os índices de violência contra mulher se ampliam velozmente. Os números de mortes por aborto clandestino, do salário desigual em trabalho igual, do desemprego e do trabalho precário ainda são estarrecedores. Os investimentos do dinheiro público em Delegacias da Mulher, em Hospitais da Mulher, em creches, etc. têm sido sistematicamente reduzidos nos últimos dez anos de governo do PT.

Além disso, com o avanço do conservadorismo e do tradicionalismo, setores da base de apoio do governo, ligados à parte mais conservadora das igrejas, buscam retroceder em algumas conquistas, como é o caso da lei que cria a bolsa estupro (Projeto de Lei que tramita no Congresso Nacional, o Estatuto do Nascituro).

Aqui novamente se impõe a necessidade de fortalecer o conceito de movimento feminista e não de gênero na sociedade patriarcal. Não podemos ratificar a ação do Estado em institucionalizar uma prática que não deve existir. O Estado não pode constituir uma política de assistência para os filhos da violência, o que devemos é mudar a mentalidade, a cultura patriarcal e superar a violência milenar contra nós mulheres.

 É tarefa do PSOL, construir uma política partidária feminista, avançamos na questão das cotas, contudo, ainda não constituímos o chão necessário para sua implementação de modo qualitativo. Para tanto, o partido deve ter mulheres nas instâncias deliberativas para que os temas do feminismo sejam contemplados na cotidianidade das decisões políticas.

Investir na formação de núcleos feministas, no empoderamento das mulheres para que elas não sejam apenas secretarias, fotógrafas, colaboradoras com o café, as mulheres devem ser uma das referências do Partido, aqui devemos alterar a divisão sexual do trabalho. Homens e mulheres pensam. Se avançarmos nesta cotidianidade não enfrentaremos o problema de cumprir as cotas, ainda não chegamos a uma realidade em que haja mais mulheres do que o número de vagas previsto.

Além da ação partidária, o PSOL tem realizado seu trabalho através de seus parlamentares e da inserção nos movimentos sociais defendendo a autonomia das mulheres sobre seus corpos e os direitos sexuais e reprodutivos, o partido tem cobrado do governo brasileiro ações que barrem essas leis retroativas.

Apesar da ampliação de políticas públicas e a criação de órgãos de proteção à mulher em vários estados do país nos últimos anos, algumas políticas públicas instituídas no governo Dilma Rousseff estão sendo bastante criticadas como é o caso do programa Rede Cegonha que prevê medidas de políticas públicas para amparo a mulheres gestantes e a recém-nascidos. O programa acabou focalizando apenas o período materno-infantil, quebrando com uma visão de atenção integral à saúde das mulheres, em todos os ciclos da vida.

Nos órgãos de proteção à mulher, ainda faltam estrutura física e contratação de pessoal especializado (psicólogas, peritos, assistentes sociais). Alguns órgãos funcionam precariamente, não possuem Plantão 24 horas, além do péssimo atendimento dado a essas mulheres. Os instrumentos existentes hoje para proteção da mulher são importantes, mas não têm dado conta da violência doméstica. A Lei Maria da Penha cumpre sua função inovadora, mas ainda falta estrutura principalmente nas cidades do interior, onde em muitos lugares nem existem órgãos de atendimento.

Para mudar essa realidade, é necessário continuar a luta e neste sentido o PSOL deve continuar contribuindo para debates, buscando informações, organizando e fortalecendo os movimentos sociais, bem como o feminista, para enfrentar coletivamente os problemas das mulheres, que ocorrem cotidianamente nos locais de trabalho, de estudo e na vida privada de homens e MULHERES!

2. A importância do movimento feminista na conquista de direitos para as mulheres.

No Brasil, os anos setenta e oitenta do século XX foram significativos na luta pelo feminismo. Este não é novo, desde a Revolução Industrial as mulheres lutam por suas questões, a luta pelo direito ao voto e por ser dona de seu próprio corpo são duas estacas singulares da bandeira feminista.

No contexto de redemocratização brasileira, o feminismo ganhou corpo. Ali o país vivia grandes transformações, sobretudo, pela retomada da democracia, em comemoração ao fim da ditadura. O movimento pela  Diretas Já fomentou junto as mulheres as esperanças de uma vida mais digna para a população. O movimento feminista, como não poderia deixar de ser, ganha impulso neste período acompanhando uma explosão de movimentos sociais em quase todo o país. É neste contexto histórico que emerge junto à cena pública a figura das mulheres protagonistas, agentes sociais de mudança que lutam por transformações não apenas políticas, mas também por transformações culturais e sociais que abrangem suas vidas cotidianas.

Esse movimento feminista, luta pela redemocratização do país, ao passo em que procura trazer para a esfera pública reivindicações por igualdade de direitos políticos entre mulheres e homens, além de questões até então tidas como do âmbito privado, como; as discussões sobre gênero, direito ao corpo, a descriminalização do aborto, a violência contra a mulher, à saúde, o desejo, a sexualidade, planejamento familiar, a divisão de tarefas no âmbito doméstico, dentre outros temas relacionados à subjetividade das mulheres.

O movimento feminista foi decisivo na transformação e no questionamento dos valores e das práticas sociais excludentes, culturalmente estabelecidas nas relações entre os gêneros. Para, além disso, o feminismo apresenta-se como um movimento que tem o compromisso de opor-se à dominação masculina, buscando unir forças com outros seguimentos sociais para ultrapassar os limites dessa ordem social excludente, e assim redefinir os papéis sociais da mulher na sociedade contemporânea.

II. O papel do PSOL na construção de um movimento de enfrentamento à violência contra a mulher

O crescimento e o fortalecimento em curso do Setorial de Mulheres do PSOL deve ser refletido em ações que intentem uma maior qualificação, atuação, fortalecimento e organização dos espaços de militância. Estamos em processo eleitoral, quantas deputadas estaduais e federais, senadoras e governadoras despontam no quadro político atual? Em 2016 teremos eleições para prefeitas e vereadoras, quantas mulheres estarão a frente do processo de disputa política no Partido PSOL e na Sociedade?Que ações o partido pode fazer para favorecer a implementação da política de cotas de um modo qualitativo?

As ações tanto da disputa eleitoral quanto as das lutas em movimentos sociais coadunam e, entendemos que o Partido via Setorial de mulheres deve liderar a elaboração de um programa visando proporcionar um movimento de enfrentamento a violência sofrida pela mulher em todo território brasileiro, devendo este ser um tema da disputa eleitoral 2014.

Apesar do avanço considerável, incontestavelmente, ainda existe um abismo entre a Lei Maria da Penha que pune a violência doméstica e uma mudança significativa de comportamento dessa sociedade patriarcal e machista.

Nesse contexto, sabemos que a educação possui um papel fundamental na transformação social. No entanto, a população brasileira está distante de ter acesso a um projeto qualitativo de educação que priorize a igualdade de gênero, classe, raça, ou seja, de “direitos humanos das mulheres”. É imprescindível dar uma tratativa educacional para a situação da mulher, pois, inevitavelmente, ao conhecer à origem dessas práticas milenares de relação de poder e dominação do sexo feminino pelo masculino, o quanto essas opressões foram legitimadas pelas várias ciências como a biologia, desmistificando a maneira como nascera e se “perpetuaram”, conseguiremos romper com as estruturas que as oprime.

O desafio das mulheres do PSOL e do próprio partido é buscar a ampliação dos espaços de discussão para que as mulheres saiam da situação de vitimização e, assim reparar os danos causados, durante séculos, com o modelo de anulação da educação da mulher para o mundo externo e com a exploração de classe.

Nesse sentido, é fundamental e urgentebuscarmos uma ampliação desta temática de gênero/feminismo nos estudos das ciências sociais e sua inclusão como obrigatoriedade no currículo de ensino, a exemplo do que prevê a Lei nº 10.639, de 9 de Janeiro de 2003, que estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional, com a inclusão no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática História e Cultura Afro-Brasileira, abrindo espaço com ações planejadas para problematizar o tema no ambiente escolar, implementando ações afirmativas de reflexão e discussão, desmistificando a inferioridade da mulher e, sobretudo, elaborando conhecimentos significativos para as mudanças de comportamentos sociais que possibilitarão a transformação das relações, contribuindo para o fim da desigualdade, violência de gênero e violência de classe.

Para, além disso, o debate feminista deve tomar as ruas, já que as manifestações de violência física, moral, patrimonial, institucional, sexual e psicológica, baseadas no gênero, são praticadas contra as mulheres em todos os espaços. São diversas as formas de agressão que as mulheres podem ser vítimas sendo uma afronta aos direitos fundamentais invioláveis do cidadão brasileiro diante do ordenamento jurídico constitucional. Além de ser uma das formas de violação dos direitos humanos.

5. Considerações finais

Este documento é produto de um dialogo com o texto produzido pela corrente TLS (trabalhadores na luta socialista) de âmbito nacional. Aqui,na Estadual, temos a intenção de crivar sobre a importância da retomada do conceito de feminismo, mudança de mentalidade da cultura patriarcal e inserção qualitativa na política institucional de intelectuais orgânicas.  Para tanto, as instâncias partidárias tornar-se-ão fomentadoras de políticas com recorte de gênero, etnia e classe social, sempre tendo por destaque as mulheres.

É necessário ainda fortalecer as discussões em torno da atuação das políticas públicas voltadas à igualdade de direitos entre mulheres e homens. Políticas essas que visem o fortalecimento da autonomia feminina, a erradicação da extrema pobreza e combate às formas de violência, sendo necessária a fiscalização das ações do Estado no que tange a proteção legal das mulheres vitimadas pela violência.

Por sermos um partido necessário na luta pelos direitos das minorias e excluídos do nosso país, o Setorial de Mulheres do PSOL, juntamente com os demais militantes do partido deverá garantir uma participação efetiva marcando presença nas lutas e nas ruas, para que possamos garantir um combate à violência contra a mulher, a autonomia do corpo da mulher, mudanças necessárias na legislação etc. Não podemos ficar apenas no campo teórico, o feminismo deve ir às ruas.  Portanto, é  necessário realizar constantes marchas.

Faz-se necessário:

ü Elaborar políticas de Estado, exigindo que este as coloque em prática. O Estado deve ser responsabilizado pelas desigualdades existentes, essa prática trará ainda um amadurecimento de uma ação coletiva que rompa o território partidário contribuindo para mudanças efetivas e profundas na sociedade.

 ü Devemos lutar por mudanças legais que proporcionem um maior poder real para combater a discriminação social, econômica e política. Devem ser exigidos que os meios de comunicação se comprometam com o combate a violência sexista e a não banalização da mesma.

ü Organizar debates em comunidades utilizando as escolas como locais de encontros, onde se envolva profissionais, alunos, familiares demais interessados, na perspectiva de reverter valores incrustados em nossa sociedade os quais reproduzem a violência e a desigualdade entre as pessoas independente de gênero ou cor da pele.

 ü Criar grupos de mulheres, assessorados por especialista, onde as mesmas possam trocar experiências encorajando-as a falarem e serem ouvidas sobre a problemática que vivenciam e as encorajar por uma mudança de sua realidade após perceber que não estão sozinhas.

 ü Organizar manifestações públicas exigindo a punição de criminosos bem como o Setorial de mulheres do PSOL deve incentivar as mulheres a denunciar os atos de violência, rompendo com o silêncio a fim de  diminuir a impunidade.

 ü  “Por um mundo onde sejamos socialmente iguais, humanamente diferentes e totalmente livres”. Rosa Luxemburgo

ASSINAM ESSA TESE:

TLS (Trabalhadoras na Luta Socialista) do estado de São Paulo e Mulheres do PSOL Regional ABCDMRR e Baixada Santista.
Ana Paula (PSOL SBC – movimento sem casa)
Cláudia (PSOL Mauá)
Cristiane Gandolfi (delegada sindical da UMESP – Simpro ABC/PSOL SBC)
Cristina Ganzerli (PSOL Mauá)
Cristina (Movimento sem casa/PSOL SBC)
Maria Aparecida Santos (PSOL – SBC)
Maria Devani Simões (PSOL – SBC)
Maria de Lourdes Souza (Apeoesp SBC/PSOL SBC)
Marina Benedito (PSOL SBC/Apeoesp SBC)
Nayara Navarro (Apeoesp/PSOL SBC)
Nausa (PSOL Mauá)
Poliana Nascimento (Psol Itanhaém/Apeoesp Itanhaém)
Rita Diniz (PSOL Salto/Apeoesp Salto)
Rosa Nobuko Maeda (PSOL SBC/Apeoesp SBC)

*Documento apresentado pelas companheiras da TLS no IV Encontro Nacional de Mulheres do PSOL